Onda de violência armada no Grande Recife espanta, mas já não surpreende
Texto: Camila Deschamps
Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil
Na última terça-feira (28), a população brasileira testemunhou um momento de alarde violento no Rio de Janeiro, marcado por um massacre de civis dos Complexos do Alemão e da Penha, na capital carioca. A operação foi conduzida por policiais militares, que foram aos territórios e ceifaram as vidas de 121 indivíduos. Apesar de preocupante, o recente episódio não é um caso isolado; ele dialoga diretamente com o crescimento da violência policial nas grandes capitais brasileiras.
Em termos de insegurança pública, a capital pernambucana não passa despercebida e as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e mídias independentes se mobilizam em prol da divulgação de informações sobre a pasta. No último mês de abril, foi concluído um projeto do Instituto Fogo Cruzado, Marco Zero Conteúdo e o Fórum Popular de Segurança Pública de Pernambuco; o estudo realizado levantou dados a respeito de jovens entre 12 e 17 anos vítimas de violência armada na Região Metropolitana do Recife (RMR) durante o período de 6 anos.
Ao fazer um simples paralelo, fica evidente a necessidade do alerta para a situação da segurança pública do Grande Recife, que não é distante do cenário do Rio de Janeiro. Na pesquisa em questão, entre 1º de abril de 2018 e 9 de abril de 2025, 800 adolescentes foram baleados na RMR, o que representa uma média de 10 indivíduos baleados por mês. Do total de meninos e meninas vítimas, 529 deles morreram. O levantamento também apontou o Recife, Jaboatão dos Guararapes e Cabo de Santo Agostinho como as três cidades mais violentas da região, concentrando 60% dos adolescentes baleados no período; em quarta e quinta posição, estão os municípios de Olinda e Paulista.
A pesquisa explora, ainda, outros recortes: entre as vítimas de raça identificada, 85% do índice de baleados é representado por pessoas negras, o que confere números 6 vezes maiores do que as vítimas identificadas como brancas. Já a perspectiva de gênero do estudo revela que 91% dos adolescentes pernambucanos vítimas da violência armada são homens, o que comprova expressiva disparidade neste aspecto.
Assim, faz-se necessário reforçar que o Manual de Uso da Força da Organização das Nações Unidas (ONU) proíbe atuações desproporcionais e sem precaução, o que não foi cumprido na chacina promovida pela Polícia Militar do Rio de Janeiro na última terça-feira. A segurança pública deve ser desempenhada em prol de todas as populações, raças, faixas etárias e camadas socioeconômicas.
A sociedade civil organizada repudia qualquer tentativa de atuação da segurança pública que envolva a atividade policial abusiva e indiscriminada. É imprescindível recorrer ao direito ao território para compreender a relação dos indivíduos com a cidade e a urgência de combater a violência armada, sobretudo, nas regiões periféricas.
Luís Emmanuel, advogado e coordenador do programa Direito à Cidade (DC), do Cendhec, observa a recorrência da atuação truculenta contra os bairros mais empobrecidos, principalmente as pessoas pretas e pobres, como ocorre nos Complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, e nas comunidades das grandes cidades do país.
O advogado aponta: “Esse é o resultado de uma violência persistente, em alto grau, que a gente já denuncia há muito tempo que a periferia sofre, seja na falta da política pública, seja na atuação repressiva, extremamente forte da polícia e dos órgãos de segurança”. Luis ressalta a ausência de políticas de inclusão social dos jovens periféricos como um agravante. “A juventude entra como um grupo marcadamente atingido pela violência da polícia desde o baculejo até a falta de perspectiva depois do ensino médio […] são lançados para a política pública de repressão, de morte sumária, dessa falta de perspectiva, de um projeto de vida que contemple os direitos fundamentais”, pontua.
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